Apesar de se prever um ano excecional, a sua organização tarda em ser conhecida; Negociação sobre implicações na vida dos docentes não teve lugar e escolas são empurradas para uma organização “ao projeto”.
Para um ano letivo que será excecional, como o de 2021-2022, exigem-se normas excecionais e atempadamente divulgadas sobre calendário escolar, constituição de turmas, organização do ano letivo (OAL) e, ainda, segurança sanitária. Sabe-se, neste caso, que a situação epidemiológica se mantém grave, o que tem remetido muitos alunos, por vezes turmas inteiras, para isolamento, bem como professores, impondo, até, o encerramento prematuro das escolas de diversos concelhos algarvios. Só que em 7 de julho (hoje) ainda nada se conhece, com exceção para o Plano Escola+ 21|23 que foi hoje publicado em Diário da República, como anexo à Resolução do Conselho de Ministros n.º 90/2021.
Tratando-se de um ano que será o primeiro deste plano integrado para a recuperação de aprendizagens, como é designado, esperavam-se normas de caráter excecional para a sua organização. Por exemplo, acolhendo as propostas que foram apresentadas por praticamente todos aqueles que foram consultados, a redução do número máximo de alunos por turma ou o reforço do crédito de horas das escolas, criando, dessa forma, condições para responderem satisfatoriamente a todas as exigências que se irão colocar (ao nível dos apoios, das coadjuvações, das tutorias, entre outras), sem que daí resultem novos e agravados abusos e ilegalidades que, já hoje, se refletem nos horários de trabalho dos docentes.
Só que, sobre o número de alunos por turma nada é referido e, quanto ao crédito de horas, a fórmula de cálculo é exatamente igual à do ano passado, em que não havia qualquer plano específico, tanto para os TEIP como para as escolas e agrupamentos que não integram esse grupo, num caso e noutro pouco acima do que já vigorava desde 2018, em que o fator para cálculo, nos TEIP, era 10 e agora é 11 e, nos restantes casos, passou de 7 para 8. É ainda de assinalar que, em ambos os casos, continuam a ser transferidas para as escolas 50% das horas de redução letiva dos docentes, previstas no artigo 79.º do ECD. Para além destas horas pertencerem aos docentes e não às escolas, esta situação gera desigualdades que resultam das caraterísticas (antiguidade) do seu corpo docente. Relativamente às equipas multidisciplinares o número de horas letivas de reforço passa de “até 2” para “até 4”, o que continua a ser manifestamente insuficiente, face aos problemas que se apresentam nas escolas, agora agravados pela situação que se tem vivido.
Como a FENPROF tem vindo a denunciar, os horários de trabalho ultrapassam, em muito, o limite legal de 35 horas, problema que resulta do facto de as escolas, com o aval do Ministério da Educação e, muitas vezes, sob pressão da Inspeção-Geral da Educação e Ciência (que, tanto quanto se conhece, deixou de agir face às denúncias apresentadas pela FENPROF e de prestar contas, como deveria, às organizações representativas dos trabalhadores do setor), desrespeitarem o conteúdo de cada uma das componentes do horário de professores e educadores. A tendência tem sido para preencher a componente letiva, apenas, com aulas, transferir outras atividades letivas (apoios e coadjuvações, por exemplo) para a componente não letiva de estabelecimento e, depois, encaixar reuniões (que, muitas vezes, a videoconferência procura disfarçar que se realizam para além do trabalho), formações (que o plano de recuperação acrescenta às muitas já existentes e para as quais os docentes já não têm tempos), deslocações entre estabelecimentos do agrupamento e toda uma panóplia de tarefas burocráticas supostamente na designada componente não letiva individual de trabalho. Este desrespeito pelo conteúdo das diversas componentes do horário faz com que o horário semanal efetivo dos docentes seja, em média, de 46 horas e 42 minutos. Não é por falta de propostas da FENPROF que estes abusos e ilegalidades se têm vindo a arrastar.
Tanto o calendário escolar como as normas de organização do ano letivo, incluindo as que respeitam à segurança sanitária, pelas implicações que têm no tempo de trabalho, no período de férias, na formação e aperfeiçoamento profissional, nas condições de segurança e saúde no trabalho ou no exercício de direitos coletivos (matérias identificadas na lei como sendo objeto de negociação coletiva) teriam de se sujeitar a um processo negocial com as organizações sindicais. Só que, como se sabe, essa não é prática do atual ministro da Educação, que continua a não demonstrar as competências negociais e de diálogo indispensáveis ao bom exercício do cargo. O bloqueio negocial que tem vindo a ser imposto, como a FENPROF tem afirmado, é absolutamente condenável nos planos político, democrático, do relacionamento institucional, do respeito pelos professores, da consensualização e otimização de soluções…
Em reuniões que têm decorrido entre responsáveis do ME e direções de escolas / agrupamentos, quando são colocadas questões concretas que possam decorrer de decisões das escolas (redução do número de alunos por turma, reforço de apoios, reforço do crédito horário, reforço do número de docentes…), a resposta é, invariavelmente, no sentido de as escolas apresentarem projetos que serão apreciados para decisão. Ora, as escolas não podem viver de decisões casuísticas e/ou de projetos que possam ser elegíveis para efeitos de financiamento pelos fundos europeus que o governo consiga obter. As escolas têm de conhecer as normas e estas deverão ser claras para que a organização se faça atempadamente e de forma segura e permanente. Exigem-se medidas de fundo e de futuro, pois a instabilidade que resulta da incerteza ou a progressiva dependência de medidas avulsas e limitadas no tempo não lhes serve e penalizam, em última instância, as crianças e jovens que as frequentam.
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