Para apresentar o balanço do que foi o ano letivo no Ensino Superior (Universitário e Politécnico) e na Ciência, mas, também, para apresentar as suas expetativas para o que já se aproxima, a FENPROF promoveu uma Conferência de Imprensa em Coimbra, no dia 21 de julho. (inclui videos da conferência de imprensa, na íntegra, e das declarações de Mário Nogueira no final)
1) Balanço
Para além das perturbações causadas pela pandemia, que foram diminuindo de intensidade ao longo do tempo, mas ainda se fizeram sentir no 1º semestre, o balanço deste ano letivo traduz necessariamente as opções políticas para o Ensino Superior e a Investigação que foram promovidas pelo Governo neste período.
Para a FENPROF, o único progresso verificado ocorreu com a entrada em vigor do DL que regulamenta as promoções internas, no final de 2021. Recorde-se que esta possibilidade estava já prevista nas Leis do Orçamento do Estado de 2019 e 2020 e permitiu ultrapassar, até certo ponto, os enormes bloqueios ao desenvolvimento das carreiras que se vinham sentindo há vários anos.
Não sendo a solução ideal, dado que esta deveria, para nós, resultar de um processo mais abrangente de revisão e alteração dos estatutos das carreiras docentes, serviu para corrigir algumas situações de injustiça flagrante. Para além disso, permitiu também, embora tenhamos dúvidas sobre se é possível alcançar este objetivo já em 2023, aproximar as instituições daquilo que está previsto nos estatutos das carreiras em termos do peso relativo de docentes com tenure (associados e catedráticos no universitário, coordenadores e coordenadores principais no politécnico).
Desde há muito que a FENPROF vinha defendendo a separação entre o ingresso na carreira e a promoção quando já se está dentro dela e este DL vai neste sentido. Importa, contudo, esclarecer se estes concursos vão prosseguir ou não, dado que o OE 2022 não é explícito sobre esta matéria.
Outro elemento que importa sublinhar é o final do PREVPAP. Recorde-se que este processo iniciado em 2017 atravessou três legislaturas e só em 2022, depois de vários protestos promovidos pela FENPROF, as últimas pessoas indicadas para regularização pelas CAB viram a sua contratação desbloqueada pelo Ministério das Finanças, perante a notória impotência do MCTES.
Quanto ao mais, nada de novo. A precariedade no ensino superior e, sobretudo na investigação, cresce de ano para ano. Não há estímulo que possa substituir um contrato de trabalho por tempo indeterminado. Para a FENPROF é muito difícil sustentar a tese, aventada por algumas pessoas com responsabilidades políticas neste sector, de que a estabilidade compromete a inovação e a produção científica. A precariedade é uma chaga social profunda que deve ser erradicada, enquanto, a caminho desse objetivo, se mitigam os seus efeitos mais nefastos. Também por isso vemos com muita preocupação o recurso abusivo e cada vez mais frequente à figura do docente convidado por parte das IES, algo que deveria instigar o MCTES a agir, através do levantamento exaustivo e sistemático dos “falsos convidados” em cada instituição. Em várias delas, o número de docentes convidados supera o número de docentes na carreira e a lecionação de horas letivas ultrapassa as que estão estipuladas na lei. Isto é muito preocupante, refletindo o desinvestimento e o sub-financiamento crónico deste sector.
Também nos preocupa a erosão democrática que se verifica em muitas IES e, por isso, promovemos uma petição que já tivemos oportunidade de apresentar na Comissão de Educação e Ciência, exigindo a urgente avaliação e revisão do RJIES, algo que deveria ter ocorrido em 2012 mas, por falta de vontade política, ainda não teve lugar.
Declarações do Secretário geral da FENPROF no final da Conferência de Imprensa
Video da Conferência de Imprensa, na íntegra
2) Expectativas
Tendo em conta um balanço que é, essencialmente, feito de continuidade relativamente aos problemas existentes, bem como a falta de sinais políticos que nos levem a considerar que o Governo, em particular o MCTES, vai trabalhar com vista à sua correção, a FENPROF tomou a iniciativa de solicitar uma reunião ao MCTES, indicando as seguintes prioridades.
Em primeiro lugar, a necessidade de reduzir a contratação precária de investigadores nas IES públicas. Para que isto aconteça, é necessário dar condições às IES públicas para abrirem muitos concursos para as categorias de base das carreiras docentes e de investigação. Isto acontecerá se o Governo:
i) contratualizar com cada IES pública o reforço financeiro para essa abertura de concursos. Este número deverá ser igual ao número de investigadores doutorados que cumprissem exigências a definir, independentemente de terem contrato ou bolsa, vínculo público ou privado, a uma IPSFL ou não (permitindo, por exemplo, o acesso a pessoas contratadas ao abrigo da norma transitória do DL57 ou pelos CEEC individual ou institucional).
ii) assegurar que o reforço financeiro não é aproveitado pelas IES para outra coisa que não a contratação de novos docentes e investigadores, sobretudo tendo em conta que estas dispõem de verbas resultantes das aposentações que devem ser canalizadas, maioritariamente, para o ingresso nas carreiras e, uma parte, para a promoção/progressão daqueles que já se encontram na carreira.
A atribuição das verbas deverá ser objeto de planeamento para a legislatura 2022-2026 e devidamente monitorizado. O incumprimento dos compromissos por parte das IES poderá levar a penalizações, tais como: i) devolução parcial/total dos reforços orçamentais recebidos; ii) inelegibilidade para receber financiamento FCT, para as unidades de investigação, projetos e CEEC.
Em segundo lugar, a necessidade de regular o regime do pessoal docente e de investigação do ensino superior privado, assegurando a existência, em cada IES, de um corpo permanente de docentes e investigadores com emprego estável e perspetivas de desenvolvimento da carreira. A ausência desta regulamentação é lesiva dos direitos de docentes e investigadores e degrada a qualidade dos serviços prestados. 14 anos depois da exigência de um regime de pessoal docente e de investigação das instituições privadas aprovado por decreto-lei, inscrita no artigo 53.º do RJIES, o MCTES elaborou um projeto de diploma. Este, para a FENPROF, apresenta alguns aspetos positivos (ex: negociação coletiva das remunerações, direito à participação na gestão, explicitação do princípio da liberdade de orientação e opinião científica). No entanto, a proposta não clarifica devidamente o regime do pessoal de investigação, não contempla metas equivalentes às fixadas nos estatutos das carreiras do ensino superior público, no que toca ao número de docentes e investigadores nas duas categorias superiores, não estipula limite máximo para o número de horas de aulas por semana para docentes/investigadores a tempo inteiro, não inclui as horas de atendimento a estudantes no período de trabalho, não fixa o número de horas/semana que os investigadores podem lecionar, prevê o convite como regra para o recrutamento para as carreiras em vez de ser o concurso e, por fim, não prevê um período de audição obrigatória da academia relativamente a projetos de regulamentos com implicações na sua atividade profissional.
Em terceiro lugar, a importância de eliminar a discriminação a que estão sujeitos, dentro da Administração Pública, os docentes do ensino superior que podem permanecer mais de 10 anos na mesma posição salarial, mesmo tendo sempre avaliação de desempenho positiva. Seja por não terem alcançado 6 anos seguidos com avaliação excelente ou porque as IES não aplicam as progressões por opção gestionária, apenas as obrigatórias, os docentes podem ficar largos anos “estacionados” na mesma posição remuneratória. Isto configura uma situação de flagrante injustiça relativamente à generalidade das carreiras da Administração Pública, em particular às carreiras gerais, para as quais está prevista a alteração de posição remuneratória sempre que um trabalhador em funções públicas complete 10 anos de serviço com avaliação positiva. Neste sentido, a FENPROF propõe a aprovação de uma medida legislativa, eventualmente no âmbito da LOE2023, que esclareça que: i) ocorre uma alteração de posição remuneratória sempre que um docente alcance menções positivas durante 10 anos consecutivos após a última subida; ii) as IES podem realizar alterações não obrigatórias da posição remuneratória, desde que respeitem os limites legais estabelecidos para aumento da massa salarial ou, em alternativa, não ultrapassem o montante máximo dos encargos financeiros que anualmente são afetos às alterações de posição remuneratório, fixados por despacho previsto nos estatutos das carreiras docentes.
Face ao exposto, a FENPROF irá aguardar pela convocatória para a reunião com o MCTES para discutir estas matérias e outras que, eventualmente, sejam consideradas pertinentes. Iremos também agendar reuniões com o CCISP, o CRUP e o CLA para apresentação e discussão destas propostas e, já no reinício do ano letivo, mobilizar a academia em torno do combate à precariedade, da valorização das carreiras, incluindo no que toca à atualização dos salários, e da democratização das instituições de ensino superior. Estes continuam a ser os principais problemas experienciados por docentes e investigadores nas Instituições onde trabalham e a FENPROF irá continuar a lutar pela sua resolução.
O Departamento de Ensino Superior e Investigação da FENPROF
Coimbra, 21 de julho de 2022
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